Napoleão Ferraz: como este um em cada século na história de um povo


Napoleão Ferraz, primeiro grande empreendedor da região, foi "um homem do futuro que, por acidente, nasceu no passado"
O Coronel Napoleão Ferraz de Araújo nasceu no 2º Distrito de “Bom Jesus de Tremedal”, que pertencia ao Distrito de São Felipe, Termo de São João da Barra (atual cidade e município de Condeúba), no dia 9 de março de 1876, neto do fundador da família Ferraz na região: Joaquim Ferraz de Araújo, sendo seus pais João Batista Ferraz e Dona Isidora Ferraz de Araújo, grandes fazendeiros da região. Era amante dos livros, por isso escrevia bem, apesar de ter apenas o antigo curso primário. Também era um visionário, pois sonhava com o progresso de sua terra, Belo Campo, que era apenas um ponto de pousada de tropeiros e viajantes que vinham de Caetité, Condeúba e outras cidades do sertão. Foi nomeado pelo então Presidente da República, Campos Sales, Capitão da 3ª Cia. do 201º Batalhão de Infantaria da Guarda Nacional, no dia 12 de julho de 1902, como consta da patente.
Em 7 de março de 1905 retornou para o Distrito de “Bom Jesus do Tremedal”, onde abriu uma casa comercial e tornou-se negociante. No ano de 1906, desejando concretizar seu ideal em erguer uma cidade progressista, comprou a Fazenda “Bom Jesus”, que pertencia a Dona Zeferina Maria de Oliveira, viúva do Coronel Antônio Ferraz de Araújo Catão, tia da sua esposa, Dona Honorina Ferraz de Oliveira Dantas, e instalou ali uma casa comercial e ao lado de sua casa residencial. Era o começo da cidade de Belo Campo, antiga “Chapada das Cacimbas”.
Napoleão Ferraz construiu uma cidade em 1907 do nada, conforme carta-relatório escrita por ele para a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro em 15 de abril de 1914, com “ruas alinhadas e higiênicas, boa feira, Igreja, música, imprensa (…), colégio de ensino primário e secundário grátis a todas as classes (…)”. Segundo ele, “todos os habitantes de Belo Campo sabe ler e escrever”. Na carta dizia ainda que em Belo Campo existia uma população escolar superior a 600 meninos de 7 a 14 anos de idade. Para a época e local, era coisa espetacular, fora da realidade. No final de 1907 construiu uma pequena igreja, dedicada a São Sebastião, cuja inauguração ocorreu no dia 20 de janeiro de 1908, a pedido de sua tia, Dona Zeferina Fernandes de Oliveira, esposa de Antônio Ferraz de Araújo Catão, que era tia e mãe de criação de sua esposa, Dona Honorina Ferraz de Oliveira Dantas. A pequena cidade foi crescendo. Quando ninguém sabia o que era futebol nessa região fundou um grêmio esportivo em Campo Formoso, bem como uma filarmônica. Em janeiro de 1912 foi instalada uma agência dos Correios naquela localidade graças ao empenho do Coronel junto ao Ministro da Viação (o agente dos Correios se chamava Hostílio de Souza Lima), bem como, no mesmo ano ainda, fez a festa de Carnaval por aquelas bandas.
Montou uma tipografia no ano de 1913, e sob sua direção e redação imprimiu o periódico “Bello Campo”, que foi o segundo jornal que circulou em Conquista. O primeiro exemplar foi publicado em 18 de outubro de 1913. Trouxe de Salvador o professor Fabrício César Freire (nascido em 29 de março de 1893 na cidade de Picos no Maranhão) para fundar um colégio para ensinar a seus filhos e de outros. Logo depois contratou mais um professor: Eustáquio Blesa Serrano, de origem espanhola. Tudo isto causou inveja aos retrógados de Conquista daquela época, que planejaram a sua morte. Por isso é que, segundo Aníbal Lopes Viana, em seu livro “Revista Histórica de Conquista” (página 209), “homens como Napoleão Ferraz surge um em cada século, na história de um povo”.
Construiu uma estrada que ligava Belo Campo a Conquista, a mesma que permitiu que se chegasse à região o primeiro automóvel, oriundo das Minas Gerais. Outras obras em Belo Campo foram creditadas a Napoleão, como o cemitério, as caixas d’água, a primeira pousada, a usina de beneficiamento de grãos, armazém e estradas para o escoamento e circulação da produção.
Pode-se dizer, pois, que Napoleão Ferraz foi, nas devidas proporções, um Juscelino Kubitscheck, um Visconde de Mauá ou um Delmiro Golveia de Belo Campo. O poeta, escritor e advogado Vicente Cassimiro assim conceituou o empreendedor: “Napoleão era um homem do futuro que, por acidente, nasceu no passado”.
Ele pensava grande e estava sempre escrevendo e enaltecendo o crescimento e o progresso de Belo Campo e encaminhava esses escritos às autoridades da República, mostrando o quanto era importante o desenvolvimento da sua cidade para o sertão da Bahia. Tudo isso provocava ira e ciúmes nos outros coronéis. Na mesma proporção em que cresciam os irmãos Ferraz, cresciam a inveja e o ódio nos seus pretensos e disfarçados inimigos.
Os coronéis descobriram quase tardiamente que Napoleão Ferraz tinha outro grande sonho, que era ser chefe político de toda a região. Isso de fato já estava acontecendo, pois, em 19 de agosto de 1914 o então capitão recebeu do Presidente da República Hermes da Fonseca o título de Coronel Comandante de toda a região da Comarca de Conquista (a 220ª Brigada de Infantaria da Guarda Nacional), com amplos poderes de comando sobre todos os outros coronéis, conforme decreto de 6 de maio de 1914. E ainda foi concedida a patente de tenente-coronel ao seu irmão Cícero Ferraz, de apenas 23 anos de idade. Foi a gota que fez transbordar o cálice de veneno que, homeopaticamente, estava sendo ingerido pelos coronéis de Conquista e de Belo Campo. Essa “Carta Patente” desencadeou a sentença de morte do coronel comandante e de seu irmão.
Foto de 1906 (Fotógrafo: Neca Correia)
Napoleão tinha consciência de que a continuação do seu grande projeto não dependia somente dele. Por isso vinha sabiamente preparando o seu irmão Cícero, 15 anos mais moço, para sucedê-lo no futuro ou em uma provável eventualidade. Essa é a explicação para a morte dos dois irmãos de uma só vez.
Contava sempre com o apoio de seu irmão, o Tenente da Guarda Nacional Cícero Ferraz de Araújo (nascido no dia 12 de outubro de 1891), até na hora de serem mortos, juntos, numa emboscada, no dia 5 de abril de 1915, quando regressavam a Belo Campo, próximo ao povoado de “Panela” (atual arraial de Campo Formoso). Foram mortos por Manoel Lyrio Vieira e seus dois filhos João e Joaquim Lyrio Vieira, de tocaia, perto de uma cancela, a mando de Pedro Lopes Ferraz Moitinho, residente em Sobradinho, sua irmã Dona Izabel Ferraz Moitinho, Pedro Ferraz de Oliveira, residente na fazenda União, e David Ferraz de Oliveira, conforme denúncia do promotor da Comarca, Félix Edgar de Paula Ribeiro, ao juiz de direito, Aloysio Henrique de Barros Porto, no dia 20 de junho de 1920, publicada no semanário “A Notícia”, edição de 23 de julho de 1921. A história de sua morte é como um quebra-cabeça: se juntarmos as peças uma a uma, encaixando-as corretamente nos seus devidos lugares, iremos obter revelações surpreendentes. A coronela “Isabelinha” foi apenas o braço armado de um consórcio constituído pelas famílias Ferraz, Lopes, Araújo e Moitinho.
Da mesma forma como ocorreu na chamada “Guerra do Tamanduá”, também se verificou no assassinato dos irmãos Ferraz: a Polícia e a Justiça “demoraram” nas investigações e na conclusão dos processos. O Processo Criminal que envolvia as pessoas da “Guerra do Tamanduá” levou 24 anos para ser concluído e dos assassinatos dos irmãos Ferraz, 5 anos.
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